Eu acredito.
Eu quero a palavra sutil que se infiltre lenta na superfície dos teus cabelos negros,que te penetre os olhos e os ouvidos e depois, mais rapidamente, avance sobre a tua alma,depois o fígado, o pâncreas e todos os demais órgãos vitais – quiçá até o coração -para só então te tocar a mente, mas só então, tão e somente.
27 de dezembro de 2015
tão
desde o princípio
quando arrancou o agosto de meu olhar cansado
ocupou meus lábios com futuros lindos
e acalentou meus passos
sempre tão,
tão aflitos
eu já sabia
que faria dos meus braços, sua moradia
e dos meus pensamentos, endereço fixo
e esse sorriso doce que amansa meus conflitos
me faria rainha
e você, rei
meu bobo rei
meu amor tão,
tão meu
ah, os seus suspiros lentos
suas costas macias
sua mão tão,
tão firme
desfalece sobre as minhas
registro tudo,
toda essa maravilha
as pupilas dilatadas
atordoadas
tamanha a surpresa diária
que é amar alguém assim
tanto
e ainda ser amada
tanto
tão
tão
amada
acabou
enquanto houve comida na geladeira
fartura na conta
sorriso no rosto
e brasa na cama
eu sei
fui toda sua
enquanto houve peças para assistir
lugares para visitar
e mentiras para distrair
eu sei
fui completamente sua
mas no momento em que o coração chegou ao limite
e o corpo já não pode aguentar
quando o sorriso deu lugar a um medo
que até o orgasmo soube extraviar
no segundo em que a insegurança assumiu o controle
e nossos frágeis futuros revelaram sua verdadeira face
ah, deus
adeus
foi para nunca mais
mas,
ainda continuei sua
por muito tempo
até descobrir que o problema era o meu amor,
tão grande
que já não servia mais
o fim (do fim) tem fim
manda
deita
sobe
olha
agosto indo embora
nas pernas da moça
vai
queimando o tédio
fazendo arder por dentro
mudando o desespero
confundindo o juízo
sujando a cara
escorre
sem vergonha
amor concreto
Sem a modéstia de começar pequeno, você chegou mesmo com tudo, passando a régua no meu coração. Ocupou o rombo da desarticulação dos meus movimentos e fez cair toda a pauta - mas, é certo, deixou um grande saldo para a organização. Tratorou toda a insegurança que me mantinha recuada, e só não implodiu o espaço porque já era bem claro que eu, como você, só queria mesmo era sentar e ver tudo dar estranhamente certo. E o jeito encaixava. E o gosto combinava. E a gente, sei lá. Só assim. Ava.
Não era sonho.
2 de agosto de 2015
revi
quando passou o dedo nos cabelos dela, mal sabia que era nos meus que ficaria o cheiro. quando encostou a boca no lábio dela, era na minha que permaneceria o gosto. quando juntou o corpo ao corpo dela, era o meu que queimaria em brasa. insustentável brasa. que calor, o daquela noite. eu estava lá, onde você estava. insuspeitada, escondida por entre os fios dos seus cabelos negros. me traí com você, suguei a língua, enfiei o dedo, senti queimar. mas pude ver-te indo embora, quando tudo acabou. já eu, descabelada, ofegante, despedaçada – eu fui obrigada a permanecer lá. eternamente, lembrando. revivendo. e morrendo, um dia de cada vez.
1 de agosto de 2015
cheiovazio
abraços que não vai me dar
palavras que não vai dizer
e mais um tanto de coisas que não admitirá
acumulam todas em pilhas no chão da sala
não tendo onde pisar
não tendo onde pisar
piso em mim
sugo a dor,
não cura
amargura, benzinho
sua ausência me faz tão mal
contramemória
a moldura vazia protege
o coração amargurado
imagem é esperança
que não existe mais
lente não captura desilusão
medo, tédio
a câmera registra o melhor do amor para jogar na sua cara
depois
quando é consumido por ódio
quando vira mágoa
quando se transforma em nada
pena que até esse nada emoldurado
insiste em lembrar de você
chove
lá fora já chove
não cai uma gota do lado de dentro
não consigo mais chorar, cansei
só lamento
não ouço mais o meu coração
ele deve ter quebrado
quando o quebraram
os pedaços espalhados
nos cadernos
nas paredes
no asfalto
gelado
por onde passo
sem você do lado
com você por dentro
esmigalhado
de você só sinto os pedaços
morro em vida
sem você inteiro
ao lado
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