Eu quero a palavra sutil que se infiltre lenta na superfície dos teus cabelos negros,
que te penetre os olhos e os ouvidos e depois, mais rapidamente, avance sobre a tua alma,
depois o fígado, o pâncreas e todos os demais órgãos vitais – quiçá até o coração -
para só então te tocar a mente, mas só então, tão e somente.

30 de novembro de 2012

Pela passagem de uma grande


    Tempo passa, bem lentinho – eu, querendo passar também. Ah, mas eis que no último segundo, ele decide tomar impulso, rumo a um abismo infinito cuja escuridão se escancara, e eu já nem sei.
    Ele me encara, profundo. E me atrai, sua serenidade ardente, e me repele, seu estado insuspeitadamente permanente e reticente, em que se escondem mil vultos. E desde já, me confundo. Entre o desejo de chegar e o tosco medo de partir, entre o cansaço de esperar e o desespero de agir, entre a vontade de voar e o pavor de fugir, e me perder, e perder tudo o que aprendi, cada vez mais, afundo. E me acomodo de vez neste abismo, moribundo, tanto mais quanto menos profundo.
     Mas, se é que já é mesmo hora de por fim a tanta espera, peço à paz, ó paz, vê se me benze, me adultera, me convence que estou pronto pra seguir. Pois que sem ti, ó paz, sem paz, sem ela, a escuridão ainda me assalta feito fera, me engole, o abismo, me penetra - o tempo passa, mas eu vou ficando aqui.