Se as pessoas fossem coisas, poderíamos torná-las nossas, mas não são. E não podemos.
Há sempre um início de dia pra anunciar que a noite chegou ao fim. Há sempre um par de olhos a encarar os meus, malvado querubim, querendo e tentando me roubar de mim. Ele consegue. E me rouba. E me carrega consigo em sua bolsa, enquanto permaneço na cama sentindo o gosto seco da boca, o gosto amargo da boca e o gosto ausente da boca sem a outra.
Queria ser o céu que te vê todo dia por entre os edifícios, com seu paletó sinistro e a maleta cor de vinho. Mas me roubas de mim, e não posso com isso. Me roubas de mim, e é tudo abismo. Me roubas de mim, e sou só mais um pedaço rabiscado de papel ofício - tão distante da poesia que era, no início.