Eu quero a palavra sutil que se infiltre lenta na superfície dos teus cabelos negros,
que te penetre os olhos e os ouvidos e depois, mais rapidamente, avance sobre a tua alma,
depois o fígado, o pâncreas e todos os demais órgãos vitais – quiçá até o coração -
para só então te tocar a mente, mas só então, tão e somente.

21 de janeiro de 2011

AGOSTO, ADEUS

       
segura entre as tuas,
as minhas mãos geladas de vento
e me olha com olhos de quem acredita
nas palavras que abandonei ao relento
sob a ação corrosiva,
sob a ação implacável do tempo

aquece com o teu,
esse meu pé azarento
e me come com olhos de puro veneno
insuspeitado e doce como o que bebemos
para ultrapassar o firmamento

lambe esses lábios que são teus, sem vergonha
e molha essa boca que sem a tua resseca, e imponha
à minha vida, que sem a tua não se disponha
ao existir solitário
de uma anti-vida enfadonha

ante o receio da grande tormenta
ante a disponibilidade da crise maior do homem
ante o peso e o medo da morte
ante a descrença quase total no outro
ante o estar à mercê da má sorte
coração só teme,
coração só treme
ao pensar em te perder

mas já é quase setembro
e os medos se vão com o vento
e eu acredito
eu acredito
eu acredito

(que sejamos bem mais que vento
que sejamos bem mais que isso)