Eu quero a palavra sutil que se infiltre lenta na superfície dos teus cabelos negros,
que te penetre os olhos e os ouvidos e depois, mais rapidamente, avance sobre a tua alma,
depois o fígado, o pâncreas e todos os demais órgãos vitais – quiçá até o coração -
para só então te tocar a mente, mas só então, tão e somente.

15 de janeiro de 2009

Onde você se esconde?

Eu sempre achei o medo absolutamente fascinante. É um dos sentimentos mais abstratos e, ao mesmo tempo, um dos mais básicos a que o ser humano é submetido ao longo de sua vida.
A partir do momento em que nos é dada a luz, já somos obrigados a encará-lo frente-a-frente. O medo do desconhecido, de um mundo inteiro com o qual devemos aprender a conviver, uma infinidade de sabores, imagens e sensações jamais vistas por nossos pequenos olhos recém-formados. Sentimos o medo, embora ainda não saibamos que nome lhe é concedido ou sequer nos demos conta de que o sentimos, de fato. Então, o enfrentamos, em parte porque não nos resta outra opção, em parte porque ainda nos sentimos acolhidos pela figura materna – mesmo fora do útero – que, teoricamente, deve servir como um apoio, um alicerce, para este primeiro embate.
Alguns anos se passam e deixamos de ser aquelas criaturinhas rosadas com dobrinhas – e não, eu não estou falando de um filhote de bulldog – embora nossa aparência ainda não se assemelhe à de um homem plenamente formado. Já nos acostumamos às formas, às cores, aos cheiros. Estaríamos livres, então, do medo? Não. Adquirimos apenas medos diferentes. Medo de altura, medo de cachorro, medo de palhaço, medo da batata de óculos de Toy Story, medo da mulher dormindo, medo da loira do banheiro, medo de escuro, medo da morte...
Mais alguns anos se passam e mais alguns medos se rompem. Assumimos uma fisionomia quase adulta. Não cresceríamos muito mais e, a partir de agora, as únicas coisas que se acresceriam a nossa aparência seriam algumas rugas e – e não pense que poderá fugir destes últimos, moçinho! – os tão conhecidos fios de cabelo branco. Teríamos nos livrado, finalmente, dos medos que nos assolam desde o início do início de nossas breves vidas? Ainda não, infelizmente. Nossos medos, agora, são apenas mais complexos. Eles variam de caso para caso, mas podem ser facilmente resumidos. Temos medo do futuro. Mantemos o medo do desconhecido. Temos medo de não obter o que desejamos. Temos medo de desejar e de ter medo. Temos medo de exitar, temos medo de agir. Temos medo dos atos, dos motivos e das conseqüências. Temos medo de ter medo, e por isso temos tanto medo. Temos medo de perder o que conquistamos e de... bem, de não tê-los conquistado de fato. Temos tantos medos, que eu poderia passar horas descrevendo-os, um a um.
Viajamos mais vários anos a frente em nossa linha do tempo. Somos maduros, agora. Já passamos da fase das incertezas, da dos “por que?”s. Não buscamos mais a paixão avassaladora, pelo contrário. Nós somos paz, ou assim desejamos. O medo vacila, admito, mas não creio que possa desaparecer. Tememos, sim, por nossos filhos, netos, familiares, amigos. Tememos por seus medos, por seus atos, motivos e conseqüências. Tememos por nós, por eles, por todos. Simplesmente tememos. Ah, o medo...
O medo é uma sombra que nos acompanha durante toda a vida. É, de fato, o único que levamos até o fim. Alguns dizem que é o fruto da insegurança, da falta de auto-estima ou autoconfiança – besteira, na minha opinião. Não. Não acredito que haja uma pessoa sequer que jamais tenha pecado pelo medo. Que jamais tenha tido medo de perder algo – ou alguém – e justamente por isso o tenha perdido. Que jamais tenha sofrido calado por medo, ou por medo consentido. Não acredito que haja imunidade contra o medo. Acredito em pessoas hipócritas o suficiente para não o assumirem. Covardes o suficiente para não o exporem. Afinal, não são só as crianças que têm medo do escuro.