Eu quero a palavra sutil que se infiltre lenta na superfície dos teus cabelos negros,
que te penetre os olhos e os ouvidos e depois, mais rapidamente, avance sobre a tua alma,
depois o fígado, o pâncreas e todos os demais órgãos vitais – quiçá até o coração -
para só então te tocar a mente, mas só então, tão e somente.

4 de junho de 2011

CÁ ENTRE NÓS


    Cometo os mesmos erros todas as vezes. Desenho palavras que não queres ler ou ouvir, desenho palavras que nem sempre são reais, desenho palavras pra lhes tornar imortais, e que o tempo apaga. Meias-palavras, sempre furadas, ganham jeito e forma, ganham cara de fim. Nesses tempos difíceis, a gente tem que se segurar pra não correr pros braços do outro, a gente tem que ser maior que isso tudo, a gente tem que ficar duro, tem que prender o gozo, o choro e as palavras de amor.
    É certo que o meu canto é correria e que a minha histeria te conforta, mas nada disso conforma: cuspir palavras deixa com gosto de veneno o céu da boca. Então, me beije a boca e lhe absorva, e me absorva, e se absorva – mas não morra. Teu mais breve instante se tatua no gosto, no gesto e na estampa da minha roupa. Tua alegria me fascina e me derrete toda, porém, se te desenho, é só pra manter a loucura distante, disforme, difusa, confusa, pra manter louca, a loucura, louca, louca, longe-perto de mim.
    Sensível a cada toque mínimo, mais frágil a cada suspiro, mesmo te afligindo, ao chão eu me atiro, antes de ser derrubada, muralha de areia, pelo teu sopro mais sutil: queda programada, ainda que não calculada, suicídio preventivo. Eu sei, tenho o dom de ser pesada – palavras sempre no mesmo tom do entre-cruzes-e-espadas. Sente o peso das minhas patas? Em verdade, ainda não sei ser de tijolo, ainda não fui balanceada, apenas falseio e dissimulo, apenas enrijeço o corpo, meio princesa e meio ogro. Tenho camadas.
    Unidos pela fé nas co-incidencias e coisas boas da vida, passando por cima das incongruências desta subvida mais que sofrida e respirando o ar mais falsamente puro de uma praia imaginária da Bahia: Me abraça, amor, e vamos pra Avenida. Liberta-me da loucura, labirinto, quebra-cabeça, bicho de uma ou duas. Sabes que me fascina, a loucura, mas - e peço, encarecidamente, que não o contes a ninguém - a verdade é que o teu corpo me agrada mais.