Eu quero a palavra sutil que se infiltre lenta na superfície dos teus cabelos negros,
que te penetre os olhos e os ouvidos e depois, mais rapidamente, avance sobre a tua alma,
depois o fígado, o pâncreas e todos os demais órgãos vitais – quiçá até o coração -
para só então te tocar a mente, mas só então, tão e somente.

3 de novembro de 2008

Start and finish.

Não sei iniciar textos. Não sei se talvez eu devesse ter usado uma vírgula entre a frase anterior e esta, ou se talvez eu devesse ter ligado-as com uma conjunção coordenativa aditiva. Não sei nem que porra é essa. Não sei diferenciar não querer com não sentir, ou o contrário. Não sei definir átomos ou construir barquinhos de papel. Não sei fazer versos ou falar difícil. Não sei fingir ou ocultar grandes verdades ou tapar o sol com uma peneira. Não sei unir o útil ao agradável. Não sei aceitar os fatos. Não sei não fugir e não ser fraco. Não sei fechar os olhos, nem abri-los. Não sei mentir com os olhos. Não sei não me importar com datas. Não sei fabricar sentimentos de plástico. Não sei queimar sentimentos de plástico. Não sei quem eu sou, quem você é, quem eles são, mas, sim, sei conjugar verbos. O faço melhor que ninguém. Sei a taboada de oito e a raiz quadrada de quinhentos e vinte e nove. Sei o grau da inclinação da Terra e conheço as leis de Newton. Sei que o quadrado da hipotenuza é igual à soma dos quadrados dos catetos. Sei onde você esconde os seus medos. Sei de suas mentiras, conheço os seus segredos. Decorei seu nome, sobrenome e tatuagens. Conheço o que seus olhos escondem, o que seus olhos mentem, o que seus olhos pensam, o que seus olhos tentam.
Você não saberia o nome do tio do neto da prima do pai da sobrinha do genro do meu avô materno. Você não adivinharia se eu sei controlar o tempo. Você não descobriria onde guardo a caixa que contém todas as nossas datas e todos os nossos sonhos de plástico. Você não saberia o quanto eu gostaria de acreditar no que seus olhos estão lhe forçando a ver. Mas, ah, se isso fosse verdade.
Se eu acordasse um dia e visse nessa caixa todas as cartas e as lembranças e os sonhos de cores tão vivas que me fariam jurar que ainda estou vivo, faltaria me devolver a parte mais importante... de tudo isso.
Um coração não cabe em um envelope a ser entregue em mãos.
Sim, eu sei terminar textos.

[n/a] E acho que foi um dos piores que eu já escrevi, ever ._.L